Corações Endurecidos e a Glória de Deus

Por Eguinaldo Hélio de Souza

           

… mas eu endurecerei o coração de Faraó, e ele não deixará ir o povo (Êxodo 4.21)

 

Deus endureceu o coração de Faraó. Longe de impedir o Seu agir, isto resultou em glória, disciplina e vitória. Temos sempre a ideia errada de que o andar com Deus tornará tudo fácil e rápido. No entanto, ninguém leria o livro de Êxodo, aliás, ninguém se interessaria pela Bíblia se ela não estivesse cheia de situações difíceis que só o Senhor poderia resolver.

Quando nos deparamos com corações endurecidos, com pessoas que dificultam ao invés de nos apoiar, então desanimamos. Não entendemos porque pessoas de Deus tornam-se obstáculos! Dói quando o homem não se compadece de nós. Todavia, muitas vezes, é assim que Deus quer…

Precisamos aprender a confiar Nele. E isso dificilmente acontecerá se tudo o que necessitarmos vier das mãos humanas. É preciso que as mãos dos homens se fechem para então olharmos as de Deus.  A decepção com o ser humano nos lança nos braços do Altíssimo. Ele se torna o poço de águas vivas em meio ao deserto dos corações humanos. Deus brilha muito mais nas noites escuras de nossa solidão. Raramente o procuraríamos se as pessoas em quem confiamos estivessem sempre ao nosso dispor.

Dessa forma, a dureza humana produz glória para Deus. Assim foi com José e seus irmãos, assim foi com Davi e Saul, assim foi com Moisés e Faraó, assim tem sido conosco. Deus nos faz transpor os obstáculos criados pelo homem para que saibamos que Dele, somente Dele vem nossa vitória. A glória é só Dele e mais ninguém.

Assim diz o SENHOR:  “Maldito é o homem que confia nos homens, que faz da humanidade mortal a sua força, mas cujo coração se afasta do SENHOR. Ele será como um arbusto no deserto; não verá quando vier algum bem. Habitará nos lugares áridos do deserto, numa terra salgada onde não vive ninguém” (Jeremias 17.5, 6)

Com certeza, em nossa caminhada, muitos nos ajudarão e serão instrumentos de crescimento e bênçãos para nossa vida.

Entretanto, mesmo que corações se endureçam para nós, não será o fim. Será apenas uma oportunidade para Deus nos fortalecer e revelar através de nós a sua glória.

 


 Consagro

Por Eguinaldo Hélio de Souza

Consagro meu ser, para ser o que queres que eu seja, embora sabendo que jamais poderei ser o que queres sem tua graça e ajuda.

Consagro o que tenho, pedindo que me ajudes a não colocar em primeiro lugar nenhum bem, pois é tão fácil viver nesta vida em busca de coisas que ocupam o lugar que é só Teu.

Consagro meus talentos, muitos dos quais estão enterrados no medo, nas desculpas, na preguiça, na frieza e na indiferença. Que eu possa trazer à luz cada habilidade que o Senhor me deu e cumprir meu chamado, minha missão. Que cessem as escusas, as acusações, os adiamentos que têm impedido teu fluir em minha vida.

Consagro meus lábios, que já disseram tantas coisas indevidas, já semearam tantos sentimentos ruins, feriram e machucaram até mesmo os que me amam. Toca-os com a mesma brasa que tocou nos lábios de Isaias. Preciso mudar meu falar, preciso acabar com toda palavra nociva, inútil e vã que de minha boca tem brotado. Que deles se derramem palavras de graça e edificação. Ajuda-me Deus.

Consagro meu tempo, que tem sido preenchido, às vezes com coisas inúteis, às vezes com coisas vãs. Eu só tenho uma vida, que é curta e passageira. Ajuda-me a fazer de cada momento, sementes para a eternidade.

Consagro meu corpo, sim, meus olhos e ouvidos, meus pés e minhas mãos. Que eles olhem como se fosse o Senhor olhando, escutem como se fosse o Senhor escutando. Que aonde eu for, vá em teu nome e meus passos sejam os Teus. Que o Senhor toque o mundo e o cure, através de minhas mãos.

E se ainda há algo que não consagrei, se há algo que não entreguei. Quero dizer que mesmo isso pertence a Ti. Do Senhor é a terra, a sua plenitude, o mundo, e os que nele habitam (Salmo 24.1)

Peço mais uma vez tua ajuda para que eu possa deixar todas essas coisas  no lugar que lhe é devido. Que eu possa deixá-las todas em tuas fortes, soberanas e poderosas mãos.


 Conhecendo o Tempo

Por Eguinaldo Hélio de Souza

 

…da tribo de Issacar, 200 chefes que sabiam como Israel deveria agir em qualquer circunstância. (1 Crônicas 12.32)

 

Há todo tipo de tempo em nossas vidas. Há tempos bons, tempos não tão bons e tempos ruins. Há tempos de quietude e descanso e há tempos de guerra e peleja. Há tempos em que apenas recebemos promessas da parte de Deus e nada acontece. Há tempos em que as coisas começam a acontecer. Existem tempos que são de muitas lágrimas e tempos que são de muitos sorrisos. É assim para todos em todo lugar e não podemos mudar isso.

Todavia, nós só gostamos dos tempos bons e desejamos que fosse sempre assim. Por esse motivo, nem sempre estamos preparados para os dias difíceis, mesmo sabendo que são inevitáveis. Algumas pessoas, por outro lado, parece que vivem sempre em um campo de batalha, nunca relaxam, nunca descansam, nunca aproveitam os pastos verdejantes e as águas tranquilas que o Senhor lhes preparou. O tempo de cantar chegou e elas estão chorando (Cantares 2.12).

Temos que reconhecer o tempo no qual estamos vivendo e agir conforme ele. Temos que pedir a Deus sabedoria e discernimento para não correr o risco de dormir em meio à guerra ou batalhar em meio à paz. Jonas dormiu no meio da tempestade e dormiu no meio da sua missão (Jonas 1.4-6), assim como os discípulos dormiram no momento em que mais deveriam orar (Mateus 26.40, 41). Davi pecou porque no tempo de ir à guerra ele ficou em casa (2 Samuel 11.1). Por outro lado, muitos estão ansiosos e preocupados, mesmo depois de Deus já lhes ter falado ao coração e prometido vitórias. Não dormem enquanto deveriam estar descansando e esperando no Senhor (Salmo 27.14).

Qual é o tempo de sua vida agora? Tempo de guerra ou de paz? Tempo de preparo ou de desfrute? Tempo de semear ou de colher? Que Deus nos ensine o modo de agirmos em toda e qualquer circunstância.


 Confissão

Por: Eguinaldo Hélio de Souza

 

De que se queixa o homem vivente? Queixe-se cada um de seus próprios pecados. (Lamentações 3.39)

Senhor, tenho muitas culpas para confessar, mas minha maior culpa são as minhas desculpas. Eu me desculpo culpando a outros pela minha situação. Culpo minha esposa, culpo meu marido. Culpo meu irmão e culpo o pastor. Culpo o presidente e culpo o prefeito. Eu culpo o passado por coisas que já aconteceram e culpo o futuro por coisas que ainda não aconteceram. Algumas vezes chego até a cogitar que tu és, Senhor, o responsável por muitas circunstâncias desagradáveis em minha vida.

Eu tenho uma capacidade imensa de enxergar erros e falhas em tantas pessoas, enquanto as minhas eu não consigo perceber. Vejo que todos erram de todas as maneiras o tempo todo e eu não percebo que eu também faço o mesmo. Ninguém atendeu as minhas expectativas, só que eu também não atendi as expectativas de ninguém. O Senhor não me deu muita coisa que eu necessito, porque na verdade eu não orei pedindo.

Cheguei a pensar que a Bíblia não funcionava e nunca cogitei que talvez seja porque eu não aplico os seus princípios. Estou longe da obediência plena a Deus e mesmo assim acho que tenho direito à vida plena por Ele prometida. Não dou tudo a Ele, mas gostaria muito de ter tudo Dele. Quero sempre colher muito mais do que o que tenho semeado, acho que sempre mereço mais do que tenho recebido e nunca que recebo mais do que mereço. Na verdade, nunca me dei conta o quanto reclamo e quão pouco agradeço e louvo.

Por tudo isso Senhor, perdoa-me. Sei que se eu quero que tudo ao meu redor melhore,  preciso ser hoje um pouco melhor do que ontem. Preciso parar de pensar no que me devem e pensar mais no que eu devo. Preciso enfim fazer aos outros o que eu gostaria que os outro fizessem por mim (Mateus 7.12).

 


 Colunas da Casa de Deus

Por: Eguinaldo Hélio de Souza

           

 

Sempre gostei muito do texto de Gálatas 2.9 onde Paulo diz que Tiago, João e Cefas eram considerados as colunas. Havia milhares de crentes, dezenas de presbíteros e diáconos, doze apóstolos e somente três colunas. Sabemos que nenhuma casa se mantém em pé sem as colunas. Nem mesmo a casa de Deus. Basta lembrar que Sansão venceu milhares, apenas derrubando duas colunas.

“Precisa-se de colunas” seria um bom anúncio a ser posto na igreja e em cada departamento. A obra de Deus necessita de colunas, pessoas sem título ou fama, tomando para si essa tarefa.

Há muito que dizer sobre colunas. Gostaria de dizer pelo menos três coisas.

Primeiros, são as colunas que suportam o peso todo. Muitos gostam de ser carregados, mas não de carregar. Não suportam as falhas dos outros, porém desejam que todos suportem as suas. Colunas foram chamadas para estar em pé e manter tudo que está à sua volta também em pé.

Segundo, as colunas ficam paralelas entre si, nunca cruzadas com outras. Se não nos alinharmos com outros não poderemos ser colunas. Precisamos ter todos a mesma direção para sermos eficazes como colunas. Minha comunhão e harmonia com outras colunas me ajudarão a cumprir o meu papel.

Terceiro, a coluna se apóia no alicerce. A verdadeira coluna esta apoiada em Cristo. Ele é o fundamento de nossa vida. A força, por fim, não está na coluna, mas no alicerce que a sustenta. O Senhor Jesus é nosso fundamento. Nele, tudo suportaremos.

Seja você uma coluna. Suporte, alinhe-se, apóie-se no Senhor.

 

 


 O Que Você Daria Por Uma Boa Pérola?

Por Eguinaldo Hélio de Souza

 

O Reino dos céus também é como um negociante que procura pérolas Preciosas. Encontrando uma pérola de grande valor, foi, vendeu tudo o que tinha e a comprou. (Mateus 13.45, 46)

 

Em meio ao Reino de Deus vamos encontrar algumas coisas que possuem um valor inestimável. São livros, hinos, textos e até pessoas que possuem uma preciosidade que não pode ser medida por valores terrenos. Embora sejam da terra, estão marcados com as marcas celestiais. Ainda que aparentem a fragilidade e insignificância do barro, guardam dentro de si tesouros de graça, de unção e de conhecimentos divinos que fazem nossa vida ser transformadas.

Hoje há muita coisa “gospel” ao nosso redor. Somos submergidos por uma enxurrada de “coisas cristãs”, algumas tão vazias que são rótulos apenas, sem qualquer conteúdo que nos edifique. Elas estão facilmente acessíveis e muitas vezes as consumimos em excesso. São vendidas e anunciadas por todos os lados e de todos os jeitos.

No entanto, as coisas mais preciosas, aquelas que irão verdadeiramente nos edificar, precisam ser procuradas e desejadas de uma forma muito especial. Para tê-las, nós precisaremos pagar um preço maior, fazer esforços maiores, chegar até onde não chegamos.

Só acha quem procura. Não iremos tropeçar nessas pérolas. Elas não irão cair de repente sobre nossas cabeças. Elas estão escondidas em muitos campos e só pertencerão àqueles que estiverem dispostos a pagar seu preço. Por elas teremos de sacrificar nosso tempo, nossos hobbies, nossos direitos e muitas vezes até nos mesmos. Teremos de tirar de nossos olhos aquilo que é inútil e vão. Teremos que limpar nossos corações de sentimentos e pensamentos ruins. Porque se não for assim, sequer seremos capazes de vê-las, ainda que estejam tão próximas de nós.

Não é correto que aqueles que não desejam tenham o melhor do Reino. Não é justo que aqueles que não valorizam as coisas verdadeiramente preciosas tenham posse delas. Deus reservou coisas muitos especiais para aqueles que desejam coisas especiais.

Acredite, Deus tem palavras, ensinos, canções, pessoas, experiências muito especiais reservadas para você. Deseje-as, busque-as, pague o devido preço e as terá.


 Coisas Novas

Por Eguinaldo Hélio de Souza

 

E o que estava assentado sobre o trono disse: Eis que faço novas todas as coisas. E disse-me: Escreve, porque estas palavras são verdadeiras e fiéis. (Apocalipse 21.5)

Deus é um Deus de renovação. Há momentos em que Ele muda tudo em nossas vidas.

Essas mudanças podem ser dolorosas ou não, mas sempre são necessárias. Não é com facilidade que nos desapegamos de nossos planos e de nossa rotina. Às vezes as rotinas parecem tão sagradas para nós que pensamos não poder viver sem as coisas que nos cercam. Então vem Deus e muda tudo e apesar de nossa resistência inicial percebemos que podemos viver sem qualquer coisa, só não podemos viver sem Ele.

Essa renovação de Deus pode ser simplesmente em nosso interior, como se algo viesse e nos tocasse por dentro. Passamos a ver as coisas de um modo diferente e com o passar do tempo nossas atitudes mudam, ficamos mais conscientes da presença de Deus e de nossas responsabilidades como seus servos.

Outras vezes somos arrancados como que pela raiz e somos transplantados para outro lugar com outras atividades. Demora um tempo até que nossas raízes se firmem e comecemos a dar frutos novamente. E então percebemos que de fato o Pai e o agricultor mais sábio do mundo. Ele conhece cada planta sua. Cuida delas e as faz frutíferas.

Deus está sempre fazendo coisas novas em nossas vidas. Temos que ser pacientes se estas mudanças demoram e temos que aceita-las quando elas chegam. Precisamos de discernimento para saber quando aguardar e quando deixar-se levar. Esse nosso mundo é transitório e as mudanças farão parte dele até que chegue aquele dia.


 Chamada da Meia Noite

Por Eguinaldo Hélio de Souza

 

Mas, à meia-noite, ouviu-se um clamor: Aí vem o esposo! Saí-lhe ao encontro! (Mateus 25.6)

Pode ser a qualquer momento do dia ou da noite. Pode ser hoje ou amanhã, neste mês ou no próximo. Pode ser agora ou pode ser daqui a algum tempo, mas com certeza acontecerá. Ele virá, sim, como um ladrão de noite Ele virá.

Então, profecias milenares serão cumpridas e esperanças universais se realizarão. Coisas tremendas há muito aguardadas terão  lugar e um povo que ansiosamente O espera, de repente O verá. Uma trombeta soará e a voz do arcanjo se ouvirá. Mortos deixarão os seus túmulos e vivos em seus lugares serão transformados. E nas nuvens do céu ocorrerá o tão esperado encontro. Noivo e noiva se unirão eternamente.

Promessas que atravessaram os séculos deixarão de ser promessas para se tornar realidade. Palavras que foram desdenhadas demonstrarão sua veracidade. Aqueles que O esperavam, não O esperavam em vão. Sabiam que Ele viria e que viria a qualquer momento. Viveram em santidade e procuraram cumprir sua missão, porque sabiam que Ele voltaria como havia prometido e que a recompensa está com Ele. Viveram na terra com os olhos no céu, caminharam no tempo olhando para a eternidade. Sofreram, perderam e renunciaram por amor a Ele, pois sabiam que a Ele pertence o futuro.

Valeu à pena esperar, porque Aquele que vem virá e não tardará. Valeu  à pena pagar o preço, viver vida santa, renunciar o pecado, pregar o Evangelho, cumprir a missão. Valeu à pena crer na Palavra, orar, jejuar, trabalhar. Sua volta não  é apenas um ponto final. É um novo começo para aqueles que O amam e que amam a sua vinda. Sua fidelidade eterna novamente entrará no tempo e na história, para mudar definitivamente o tempo e a história.

E será surpresa para aqueles que caminham despercebidos nesta vida, mas será alegria para aqueles  que hoje clamam e proclamam: Maranata! Ora, vem Senhor Jesus!

Jesus está voltando. Prepare-se!


 Carta ao Meu Pai

Por Eguinaldo Hélio de Souza

 

Já faz cerca de dezoito anos que este silêncio dura, em parte pela distância, em parte pelos sentimentos que dormem, com medo de acordar. Você foi, eu tinha doze anos e desde então estive mudo. E surdo também na maioria das vezes. Nunca me interessou ouvi-lo e nem falar-lhe, nunca me interessou tentar reatar estes laços quebrados. A indiferença muitas vezes é o melhor remédio para a dor.

Hoje, todavia, vou nos dar uma chance, ainda que pequena. Pois mesmo que este papel possa falar e revelar tanta coisa do meu coração, permanecerá surdo e cego. Nunca me dirá de suas lágrimas, de seu gemido ou de seu riso. Nunca conhecerei seu engolir seco, seu murmúrio, sua resposta silenciosa ao ler estas letras. Mas estaremos um pouco mais perto, ligados.

Há motivos para escrever esta carta? Há motivos. Fazer desta carta-confissão um texto literário para um concurso cujo tema é “Pai, um amigo, um herói” é um deles, embora possa parecer ironia. Mas se eu não falar o que falo aqui, não quero dizer mais nada. Não me interessa dizer outra coisa, se não puder dizer o que digo aqui. Minha ficção é minha maior realidade. Não posso falar de outro pai que não você, porque o pouco pai que tive foi você. Se o que eu aqui expuser não for belo, ao menos será verdade. Tenho de ser ético antes de ser poético.

Há motivos para eu escrever esta carta? Há motivos. Você foi um exemplo. Ao inverso. Quero ser para o meu filho aquilo que você não foi para mim. Quero dar o que esperei e não tive, fazer o que jamais me foi feito, dizer palavras que  não ouvi. Seu silêncio tornou-se a voz em mim, suas omissões os meus gestos, seu desinteresse as minhas dádivas. Com a graça de Deus, pude transformar em afirmações, todas as negações recebidas e construir-me pai, com tudo aquilo que não recebi como filho. O fato de não ter pai, fez-me querer de fato ser pai.

Hoje, quando falo com meu filho em seus dez anos, é de você que eu lembro. Quando o chamo de “peão” é porque você assim me chamava. Sim, é verdade que não são muitas as lembranças. Mas justamente por me serem raras é que me são caras e preciosas. Os cabelos índios penteados para trás (brancos hoje?), o andar relaxado o falar alto e cantante, o fumo de rolo, o chinelo havaiana, a bermuda desleixada, a camisa aberta. O fusca branco, a praça onde vendemos balões de gás e brinquedos infantis. As brincadeiras de luta no sofá de casa, o passeio de ônibus ao lado do banco do motorista, o quebra queixo no ponto final. As promessas ditas a esmo, sem intenção de serem cumpridas, as lágrimas e a voz chorosa de partidas jamais realizadas e jamais justificadas. Com exceção de uma que foi para sempre.

Por incrível que pareça, estas memórias falam mais alto do que sua indiferença com as necessidades básicas do lar, marcam mais fundo do que suas brigas violentas com minha mãe, do que a ignorância com respeito aos filhos (você nunca sabia quantos anos eu tinha ou em que série estava).  O vazio desses dezoito anos foram fortes o suficiente para me criar você. Carrego a figura de um pai que não foi, mas que é exatamente o que devia ter sido. E esta imagem é forte, mais forte talvez do que se fosse tangível, mais bela do que se eu com os olhos pudesse olha-la, perfeita com um quadro que não sei pintar, mas que no íntimo da alma teci, com a sabedoria que Deus e os anos me deram. Você está aqui, um você não-você, meu pai não-pai, me inspirando a ser o que você não conseguiu, me impulsionando a terminar sua missão inacabada – fazer de e com seus netos o que você não pode fazer comigo, ser para eles o que você não foi para mim.

Procuro revolta dentro de meu coração e não acho e até me condeno por isto. Eu tinha apenas doze anos, os outros quinze, treze e seis e tivemos de enfrentar a vida sem você. Estudamos, trabalhamos, lutamos, vencemos, vivemos. E tudo isso sem você. Eu com certeza justificaria uma mágoa, mas ela não existe, nem nunca existiu. Não existiu também, é verdade, nenhuma  procura, nem um anseio ou busca para reatar laços. Apenas deixei que a vida tomasse o rumo que tomou, qual canoa à deriva na correnteza. Nada fui, além de mero espectador.

Agora porém, como vaso que cai, quebro o silêncio e deixo escoar seu conteúdo. Nesta carta digo o que jamais disse e até mesmo o que jamais quis pensar. Exteriorizo segredos profundos, sentimentos velados, pensamentos completamente particulares. Surpreendo-me dizendo estas coisas a um pai que de certo modo não tive, cuja existência se vê atestada por uma completa ausência, cuja participação se fez justamente por nunca ter participado de nada.

Penso agora que isto foi minha riqueza, chegando quase a agradecer-lhe por não ter estado aqui. Foi como se você tivesse me deixado, como única herança, um livro inacabado ao qual cabia a mim e só a  mim completar. E esta tarefa só seria possível por que você não estava ali, dizendo-me o que escrever. Dessa forma, pude idealizá-lo, santificá-lo e vivê-lo da forma que eu gostaria que fosse. E o livro ficou bonito. Quase posso sentir sua aprovação a ele.

Estranho o que escrevo aqui. “Pai, um amigo, um herói”.  Talvez meus leitores preferissem que eu falasse do pai perfeito. Como fazê-lo se eu não o tive ? Não tive o que queria da vida, mas amo o que a vida me deu. Acho que você não foi para mim o bom pai que quis ser. Eu o serei então por você, para redimi-lo. Se outros acham que eu não posso fazê-lo, eu lhes direi que posso, dizer que você pai, foi um amigo, um herói. Do seu jeito.


 A Aventura da Adoração

Por Eguinaldo Hélio de Souza

 

Adorar a Deus é uma aventura, uma estrada ascendente que subindo sempre nunca se chega ao seu ápice nesta vida. E o viajante sabe que a montanha do louvor nestas terras decaídas tem seu limite e seu tempo. Ainda assim ele se esforça para que a sua adoração chegue cada vem mais perto do cume.

Como a oração, jamais nos formaremos na universidade da adoração. Permaneceremos sempre meninos tenros tentando balbuciar alguma coisa. O adorado é infinito e por isso nossa adoração finita não pode jamais se equiparar à sua plenitude. Seremos sempre aprendizes, olhando o rosto do Adorado e tentando fazer-lhe sorrir. Não estaremos sendo impulsionados pelo medo rejeição, mas pelo amor e candura Dele.

É contemplando sua face que aprenderemos o que lhe agrada. Ele nos ensinará o que convém. Ele mesmo nos fará adoradores e moldará a adoração. Ele mesmo nos capacitará a ser para Ele o que precisamos de fato ser. Porque somente Ele está destinado a ser tudo em todos.

Não buscamos Tuas Mãos,
Tua Face queremos ver
E conhecer Teu Coração
Revela Tua Glória com Poder

Aqui o poeta sacro captou a essência da adoração. Não são as mãos de Deus que nos interessam nesse momento. Sabemos que com elas Ele pode mudar tudo em nossas vidas. Que elas estão cheias de bênçãos, de amor, de graça para derramar sobre nós. Sabemos que delas emana tudo o que desejamos e precisamos. Mas não é o que importa agora

Agora queremos ver o rosto Dele para admirar sua formosura. Queremos contemplar sua beleza e nos extasiarmos na glória que dela flui. Ele não precisa fazer nada. Quem Ele é já nos basta.

Não importa o que há em suas mãos. Queremos conhecer o profundo do que há no coração de Deus. Queremos que o Espírito traga ao nosso espírito o que há no coração de nosso Amado. “Porque o Espírito penetra todas as coisas, ainda as profundezas de Deus” (1 Co 2.10) E o Espírito em nós nos capacite a oferecer aquilo que lhe é agradável.

Isso é adoração